Por Isa Barreto
'Quarteto Fantástico – Primeiros Passos' marca o retorno de uma das equipes mais icônicas dos quadrinhos ao cinema, mas desta vez com um cuidado que nunca antes havia sido visto nas adaptações anteriores.A Marvel entende que não basta mostrar poderes impressionantes: o público precisa sentir quem está por trás deles. E é justamente por esse caminho mais humano, mais emocional e menos frenético, que o filme encontra sua força.
Desde sua criação em 1961, o Quarteto sempre representou algo diferente dentro do universo da Marvel: uma família, um grupo que convive com as próprias falhas, que briga, que se reconcilia, que se transforma — por dentro e por fora. Eles não são os mais poderosos, nem os mais populares, mas são os que mais carregam o peso do que é ser humano diante do desconhecido. E esse espírito está muito presente nesta nova versão.
A direção de Matt Shakman, que já havia explorado com competência emoções profundas em 'WandaVision', aposta novamente no poder do silêncio, do olhar, das conversas difíceis. Ele não tem pressa de mostrar os heróis em ação. Prefere, primeiro, nos fazer sentir suas dores, seus medos, suas rupturas. Isso faz com que a construção da equipe seja gradual, com tempo para o público se conectar a cada personagem individualmente — uma abordagem que, infelizmente, nem sempre tem sido priorizada no Universo Cinematográfico da Marvel.
Pedro Pascal assume o papel de Reed Richards com a serenidade de quem sabe que inteligência não resolve tudo. Seu Senhor Fantástico é um homem dividido, marcado por escolhas que afetam não apenas o mundo, mas as pessoas que ele ama. Vanessa Kirby, como Sue Storm, se torna o centro emocional do filme. Ela é o elo que tenta manter tudo em equilíbrio, mesmo quando tudo está prestes a desmoronar. E faz isso com uma atuação contida, mas poderosa, como se cada gesto carregasse um pedaço da história daquela família. Joseph Quinn, conhecido pelo carisma rebelde em 'Stranger Things', traz para Johnny Storm a chama certa entre provocação e vulnerabilidade. Ele é o mais impulsivo, o mais intenso, mas também o mais perdido. E Ebon Moss-Bachrach entrega uma versão do Coisa que comove sem precisar de exageros. Ben Grimm é força e solidão. É alguém que perdeu sua auto estima para continuar lutando.
Os efeitos especiais estão lá, sim — e funcionam muito bem diga-se de passagem. Mas é quando o filme nos leva para dentro da dor, da dúvida e da busca de identidade de cada um que ele realmente se destaca. Não é uma história sobre poderes, é sobre como lidar com as consequências deles. E essa é uma escolha narrativa que valoriza o legado original do grupo nos quadrinhos, ao mesmo tempo em que posiciona o filme de forma madura dentro do Universo Cinematográfico da Marvel.
Mas o ponto que realmente humaniza esta história — e que a distancia dos filmes anteriores — é a decisão central dos personagens: eles escolhem a família. Quando Galactus surge como uma ameaça cósmica e impõe uma escolha devastadora, Reed e Sue se negam a entregar seu filho, Franklin, mesmo que isso signifique colocar tudo em risco. É nesse momento que o filme mostra que, acima de tudo, esses heróis são pais, irmãos e amigos. E que o verdadeiro heroísmo, às vezes, está em dizer “não” à lógica, em proteger quem se ama, mesmo diante do incontrolável.
Há ainda presenças importantes para os fãs mais atentos. A introdução de Shalla-Bal, uma versão alternativa da Surfista Prateada vivida por Julia Garner, adiciona camadas cósmicas à trama sem roubar o protagonismo do quarteto. E a figura ameaçadora de Galactus, interpretada por Ralph Ineson, cumpre seu papel como o grande desequilíbrio da balança entre o íntimo e o épico.
'Quarteto Fantástico – Primeiros Passos' pode não ser o filme mais barulhento da Marvel, mas talvez seja um dos mais necessários. Ele resgata a essência de quem esses personagens são, muito além das capas e dos poderes. Com atuações sólidas, uma direção sensível e um roteiro que respeita a inteligência emocional do público, o filme prova que, às vezes, o mais fantástico está em ser real.