Por Isa Barretto
Quando pensamos em filmes de zumbis, logo vem à mente o caos absoluto: sobreviventes em fuga, perseguições incessantes e um espetáculo de sangue. O gênero se consagrou nesse frenesi de destruição, mas 'Extermínio: A Evolução', dirigido por Danny Boyle, segue por outro caminho. Sem ignorar a brutalidade, o filme aposta em uma abordagem rara: íntima, intensa e profundamente humana. O medo está presente, mas é o afeto que guia a trama — e é no meio do horror que o amor revela sua força.
No centro dessa história está Spike, interpretado com emoção por Alfie Williams. À primeira vista frágil e inseguro, o garoto se transforma em símbolo de resistência. Ele atravessa a floresta com a mãe debilitada (Jodie Comer) em busca do último médico sobrevivente, vivido por Ralph Fiennes. A cada passo, Spike carrega o medo, mas também a coragem de quem ama. Aaron Taylor-Johnson completa a família no papel do pai — rígido por fora, mas com fissuras de humanidade. Visto por Spike como um herói, ele perde esse posto ao falhar diante da mãe, e essa quebra redefine para sempre a relação entre pai e filho.
O pano de fundo é tão inquietante quanto os dramas pessoais. O vírus evolui, criando diferentes tipos de infectados — rastejantes e alphas brutais. Já os humanos, acuados pela incerteza, se dividem em facções de sobrevivência com regras duras, onde qualquer contato externo é visto como ameaça. O medo da contaminação não só distancia os corpos, mas também fragmenta a convivência.
Ralph Fiennes dá vida a um médico recluso e pragmático — não é salvador nem vilão. Ele oferece o cuidado possível, com humanidade e limites claros, sem prometer milagres. Sua presença sustenta a tensão na medida certa e reforça sua versatilidade como ator.
O roteiro de Boyle e Alex Garland mantém o espectador em uma corda bamba: a esperança surge, mas logo se dissolve. A cada nova virada, parece haver uma chance de futuro — até que ela é arrancada, de repente diante do espectador. Essa oscilação entre a expectativa e o desespero torna a jornada de Spike ainda mais intensa.
A fotografia de Anthony Dod Mantle reforça esse contraste: florestas verdes que de repente se tornam palco de caos, como se a natureza também estivesse em colapso. Em vários momentos, a câmera se aproxima da simplicidade de um documentário, ampliando esse desconforto. A trilha de John Murphy acompanha essa cadência, alternando entre o silêncio contido e explosões sonoras que remetem a gritos, acelerando o coração e transformando a música em parte essencial da narrativa.
'Extermínio: A Evolução' se diferencia justamente por unir o terror físico ao drama humano. O horror não está só nas ruas devastadas, mas também no corpo que muda e na sociedade que se fragmenta. Boyle entrega mais do que um filme de zumbis: ele propõe um retrato direto da nossa natureza, em que medo e esperança se alternam como forças invisíveis.
Agora a pergunta que não quer calar : se o vírus continua a evoluir e a sociedade a se fragmentar, o que nos resta afinal: a esperança de preservar nossa essência ou a certeza de que também estamos destinados a ruir?