segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

NOS CINEMAS - Rogue One: Uma História Star Wars


Por Rafael Morais
19 de dezembro de 2016

Logo no início do episódio “IV – Uma Nova Esperança” descobrimos que a princesa Leia recebe os planos de uma potente arma, construída pelo Império, capaz de exterminar planetas inteiros. Mas como a planta dessa bomba foi parar no colo da líder da rebelião? Pronto, é aí que “Rogue One – Uma História Star Wars” entra em cena como um derivado da franquia contando a história do esquadrão de rebeldes que rouba os planos da “Estrela da Morte”, se encaixando, cronologicamente, entre os episódios III e IV. Disposto a ser um capítulo à parte, o filme tenta se desvencilhar da sequência desde a introdução. Portanto, esqueça aqueles letreiros com a fonte clássica, em amarelo negrito, subindo no estilo slide up ao som da trilha de John Williams.

Desta forma, neste prelúdio, somos apresentados a Galen Erso (Mads Mikkelsen), um notável cientista forçado a trabalhar para o Império no setor bélico, tendo a sua família dizimada por não querer contribuir com este poder sombrio que derrubara a República. Com exceção da sua filha Jyn Erso, que ainda criança foge para sobreviver, se transformando em uma rebelde nata.

Recheado de personagens, o roteiro guarda nos coadjuvantes Chirrut Îmwe (Donnie Yen), Baze Malbus (Wen Jiang) e no carismático droide K-2SO o seu trunfo, já que a protagonista Jyn, vivida pela superestimada atriz Felicity Jones, não consegue cativar o espectador (pelo menos a mim). Em momento algum sentimos a dor, ou somos convencidos da motivação da heroína, apesar de estar lá. Já Diego Luna traz uma tridimensionalidade ao seu Cassian Andor, aproveitando melhor as nuances de sua persona.

Com um segundo ato inchado, o filme se arrasta por diversos planetas, mas se fixa em Saw Guerrera (o oscarizável Forest Whitaker), um rebelde extremista, que nem mesmo a Aliança o reconhece, para traçar - com muito esforço e boa vontade do público que queira enxergar esse pano de fundo - um paralelo da guerra e suas motivações com o que vivemos hoje em dia. Afinal, os terroristas são sujeitos que não reconhecem um poder ditatorial/imperial e lutam pela sua liberdade? Ou findam paranoicos deturpando os valores e cometendo atos de extrema intolerância, muitas vezes visando assumir este poder? A linha parece tênue e dialoga com a alarmante situação atualmente, sobretudo no Oriente Médio, refletindo na América e Europa através de sucessivos atentados. Contudo, o Império em Star Wars merece ser combatido por construir, comprovadamente, uma arma de destruição em massa colocando a vida de todos em risco, já que quem discordasse dos seus objetivos seria dizimado. Ok, mas essa não era uma das desculpas utilizadas pelos Estados Unidos como subterfúgio para invadir o Iraque em 2003?

Entretanto, voltando ao filme, temos um script bem dosado na utilização de gag’s e dos elementos dramáticos, sem o surgimento de piadas deslocadas (e tem uma de humor negro impagável) ou dramalhão desnecessário. A fita é sobre guerra e tem ciência disso. Comovente também em momentos pontuais, o instante em que associamos o apelido carinhoso que um pai dar à sua filha (Galen à Jyn), com o nome de uma arma catastrófica, principal vilã, é de uma sutileza ímpar.

Por sua vez, o diretor Gareth Edwards captou a essência de Guerra nas Estrelas ao reproduzir cenários reais, animatrônicos, harmonizando com a computação gráfica clean, respeitando a essência dos personagens, em detrimento do abuso de CGI’s e um tal “Jar Jar Binks”, pecados que George Lucas cometeu nos episódios I a III. Ao desconstruir alguns mitos concebidos na trilogia clássica, como o menino Vader na pele do meigo Jake Llloyd, Lucas parece não ter se encontrado com o próprio universo que construiu: teria sido uma crise de identidade ou o interesse de caça-níquel falou mais alto?

O fato é que “Rogue One” é um prato cheio não só para os fãs do universo estendido de Star Wars, como também para os que conhecem apenas o básico. A ação é filmada com excelência tanto no ar (Tie Fighter’s e Aliança travam duelos épicos no espaço), quanto em terra firme (os At-At’s nunca foram tão ameaçadores e verossimilhantes). Inclusive, a batalha na praia é uma das cenas mais legais de toda a saga! Neste quesito, a fotografia de Graig Fraser conversa com os efeitos visuais, tornando o frame a frame lindo em cada quadro. E por mais que não vejamos jedis ou lutas de sabres, há uma atmosfera instaurada que grita Star Wars. Sentimos a presença de Obi Wan, apenas em uma rápida menção que nem sequer cita o seu nome – o serviço ao fã é a razão de existir deste spin-off - e a “Força”, como um mantra que motiva a trupe, está lá para quem quiser sentir.

Ao final, com um terceiro ato irretocável, este corajoso título resgata a essência da trilogia clássica, revigorada por uma sequência de suspense claustrofóbica com Darth Vader no centro da ação, contribuindo ainda mais para a mitologia de um dos maiores vilões da história do cinema.                           


*Avaliação: 4,0 pipocas + 4,0 rapaduras = nota 8,0.                                                                                      

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

TEATRO - Potter

Por Rafael Morais
01 de dezembro de 2016

Ok, eu confesso: não sou fã da saga Harry Potter nos cinemas; e sou ex-aluno do Colégio Dom Quintino, com muito orgulho! Dito isso (ufa, precisava desabafar!), o Festival de Dança do DQ deste ano trouxe o tema “Potter” através de uma linda montagem teatral, capaz de nos levar do Expresso às dependências da escola de Hogwarts. Como não lembrar os irmãos Lumiére com o seu filme experimental: “A Chegada do Trem”, enquanto acompanhamos, logo no início da peça, a estação e os personagens que passamos a seguir? Para um cinéfilo, as referências pipocam na cabeça.

Assim, acostumado a assistir, todo ano, aos magníficos festivais do Colégio, percebemos a diferença no cenário, desta feita em sua maior parte digital - por meio de um enorme telão em alta resolução - o que configura um acerto por parte da direção de arte do espetáculo, afinal de contas rivalizar com as suntuosas locações dos filmes se tornaria inviável. Mesmo assim, quando surge um efeito prático, um objeto de cena físico, vislumbramos o belo trabalho do artista plástico Raimundo Dias Vieira (o talentoso Jocieldo) tomando conta do ambiente e nos imergindo ainda mais na história.

O que dizer do figurino caprichado e das cartinhas caindo do céu, literalmente, interagindo com o público a atmosfera lúdica proposta? Fantástico! E como estamos falando de um evento escolar, imagino a emoção dos pais presenciando as suas pequenas vestidas de maquinistas ou de porções mágicas: uma fofura sem tamanho!

Mérito também para a excelente escolha das canções, que passeia pela própria trilha sonora da franquia, épica por excelência, passando por um dance eletrizante, até as repaginações de Boyce Avenue, tudo na medida. Na verdade, a utilização de músicas anacrônicas, uma das características do Festival em todas as suas edições, não só auxilia na ritmização, como também empolga o espectador. Buscar regravações de um som extremamente conhecido traz frescor e jovialidade à montagem.

Contudo, como vivemos na era dos cosplay’s, gostei da entrega dos alunos ao pintarem o cabelo nas cores de suas personas, trazendo um toque de verossimilhança. Porém, senti falta do protagonista não estar com o corte /penteado parecido com o do Harry, por mais que a armação redondinha dos óculos ajude a lhe identificar. Todavia, a maquiagem merece aplausos na composição do vilão Voldemort e do elfo Dobby, especialmente.

O ballet, o jazz e a dança contemporânea são estilos muito bem representados na coreografia de Gorete Maia e Jessé Anastácio. A expressão corporal carrega vigor, paixão e sensibilidade, quando necessário. Não deve ser fácil ensaiar e controlar aquela garotada, sobretudo a ansiedade.

Por fim, as irmãs Melissa e Milena Mangueira, responsáveis pela direção geral do Festival, podem se sentir orgulhosas do trabalho realizado, pois, entre outras conquistas, conseguiram despertar em mim a vontade de dar uma segunda chance à filmografia do bruxinho. Ou será que ainda estou sob os efeitos da magia a que fui submetido no teatro há dois dias? 

*Avaliação: 5 pipocas + 5 rapaduras = nota 10.