Por Rafael Morais
20 de fevereiro de 2017
Dono de uma montagem que dialoga com a proposta do
filme, "Manchester à Beira-Mar" representa um complexo estudo de seus
personagens, todos mergulhados em seus próprios conflitos e como cada um lida
com eles. Assim, o roteiro aborda a fragilidade do protagonista Lee Chandler
(Casey Affleck), com tamanha humanidade, diante da perda, quase como algo
inerente à vida daquele sujeito tão amargo.
Aliás, a composição de Lee pelo ator carrega nas
expressões corporais, nos ombros arqueados, no modo calmo de falar, e ao mesmo
tempo explosivo em suas atitudes, deixando uma controvérsia na cabeça do
espectador: afinal qual o problema desse cara? Mistério esse que só será exposto
lá pelo final do segundo ato, justamente através da montagem não linear, que
vez ou outra interrompe o fluxo da história para nos apresentar um vislumbre do
sombrio passado do solitário Lee, do qual Randi Chandler (Michele Williams),
sua ex-esposa, também faz parte. Neste quesito, a direção de arte adiciona
camadas através da ambientação dos cenários, da utilização de figurinos
alternados, sobretudo na escolha da paleta de cores, bem como nos momentos de
rara leveza capazes de diferenciar o passado do presente, tudo com bastante
sutileza.
A sinopse dá conta de um homem pacato, zelador de
condomínio, que se vê obrigado a retornar à sua cidade natal após o falecimento
de seu irmão mais velho, que por sua vez deixara um filho adolescente, Patrick (Lucas Hedges). E é nesta relação de tio e sobrinho que o diretor Kenneth Lonergan
ancora o seu filme. Diversas metáforas surgem em cena para mostrar como Patrick
enxerga o mundo diante de situações extremas, revelando uma maturidade precoce,
ao passo que Lee não consegue reagir diante da apatia que lhe abate.
Depressivo, e com os seus motivos, Lee se vê preso ao passado sem conseguir
sair dele, num looping eterno de angústia. Tocante em sequências cruciais, o
longa não cansa de mostrar um protagonista que não se permite conhecer o novo,
que tem o “não” como mantra, sendo a negativa uma resposta certa para aqueles
que tentam lhe tirar do marasmo.
Frio, denso e até certo ponto perturbador, esse “Manchester
à Beira-Mar” triunfa na humanidade de seus personagens, desconstruindo os
clichês do drama, da superação forçada, deixando a catarse para ocasiões
minimalistas/ introspectivas.
*avaliação:
3,5 pipocas + 5 rapaduras = nota 8,5.