A embriagante Paris de Woody Allen.
Rafael Morais
05 de novembro de 2011
Paris exala cultura e encanta os seus visitantes, principalmente aqueles que apreciam a arte e reconhecem os seus expoentes que influenciaram os movimentos artísticos mundo afora. E é exatamente isso que acontece com Gil (Owen Wilson), roteirista de Hollywood que está passando férias com a família da noiva, Inez (Rachel McAdams). Sempre que Gil vai à Cidade Luz, busca uma reconexão com a "grande arte", bem diferente dos enlatados encomendados que acompanham o seu dia a dia em Los Angeles. Escrever os roteiros americanos, claramente, não inspira o lado artístico de Gil, que ao desembarcar em Paris, pretende terminar de escrever/revisar o seu livro, influenciado pelos ares daquele lugar.
O sonho de Gil era viver nos anos 1920, quando F. Scott Fiztgerald, Ernest Hemingway e Pablo Picasso viviam os seus ápices como artistas e homens, quando circulavam em ateliês e cafés da cidade. Impossível realizar esse sonho? Para a mente inquieta e criativa de Woody Allen, tudo é possível. Pois não é que Gil, não mais que de repente, para ser mais preciso, ao badalar dos sinos da meia-noite, embarca nessa viagem do tempo e encontra os seus ídolos literários que sempre o inspiraram.
Allen insere à trama um realismo fantástico para discutir a questão da valorização do artista, Gil no caso, ser mais compreendido/reconhecido, não só longe de casa, como também em tempos áureos de outrora. Paris parece acolher a cultura de todos e entender a arte dos incompreendidos, por isso é igualmente conhecida como uma cidade cosmopolita.
Para o cineasta, a arte não deve ser ostentada, e sim experimentada, uma vez que o personagem de Michael Sheen - amigo de Inez - dá uma de sabe tudo, e Gil, que não se identifica nem um pouco com esse tipo, logo o apelida de "pseudointelectual". Perceba que os passeios culturais, que a noiva do jovem escritor o força a realizar, são apenas momentos para que o erudito e insuportável intelectual "vomite" os seus conhecimentos.
Conhecer as estátuas de Rodin, os jardins de Versalhes, para Inez, já é um turismo cultural, mesmo que pelo período da tarde, saia com a sua mãe para fazer compras nas lojas mais caras de Paris, consumindo o supérfluo. Muito embora a Cidade Luz exale cultura, esta não se absorve por osmose. E Inez e sua trupe, com exceção de Gil, ignoram essa lógica.
Meia-noite em Paris é um filme delicado, divertido e enriquecedor. Allen volta ao seu melhor estilo elegante de filmar. Logo na abertura, somos apresentados às imagens da cidade em movimento, o cartão-postal em transformação. É o anti-museu. Aquilo que o cineasta prega, veementemente, é colocado em prática aqui, pois a intenção é apreciar a arte em sua dinâmica, longe de museus, no trivial dia a dia.
A trilha sonora suave ajuda a ambientar os personagens na Paris moderna. Da mesma forma que a bela fotografia "oxigena" os pontos turísticos e nos dá ainda mais vontade de conhecer as ruas charmosas e a arquitetura clássica parisiense, ressaltando, significativamente, o espírito do filme.
Repare que a mise-en-scène é fantasticamente orgânica entre os personagens do passado e do presente. Aposto que o diretor pediu aos atores, que passassem uma reação proveniente do misto de encantamento com o ídolo - são hilárias as expressões faciais de espanto e admiração de Owen Wilson (Gil) quando ver, por exemplo, que Picasso está pintando uma de suas principais obras, bem na sua frente - e aproveitar ao máximo aquele mágico momento.
Ao embarcar nessa "viagem" de Woddy Allen, temos a percepção de que os bons tempos não voltam mais, porém podemos fazer valer a pena o presente para sermos lembrados no futuro.
Na cena mais hilária do filme, constatamos onde foi parar o detetive, cujo sogro de Gil, intrigado pelas andanças noturnas do genro, colocou em seu encalço. Ao assisti-la, tiramos as seguintes conclusões: devemos ponderar/temer o que desejamos, e, especialmente, que a Era de Ouro não é aquilo que fantasiamos, logo os tempos de hoje poderão ser a Era dourada de amanhã.
Me convenceu, vou assisitir! kkkk
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