"Eu confio em Vince Gilligan", disse Aaron Paul ao justificar o seu retorno ao universo de Breaking Bad durante uma recente entrevista. Faço minhas as palavras do ator. Quando anunciado que "El Camino" seria uma espécie de epílogo da série, focado no destino de Jesse, a primeira coisa que me veio à cabeça foi exatamente isso: com Gilligan no comando não terá erro! E não teve, realmente.
A produção, original da Netflix, acerta quando retoma os acontecimentos do lugar onde parou. O sofrido Jesse foge aos berros catárticos rumo ao desconhecido. Uma pseudo liberdade que o fã mais apaixonado pela série sabia se tratar de algo fugaz, daí o plot ideal e a razão de existir desse longa: dar um desfecho satisfatório ao arco do personagem mais "honesto" com as suas próprias regras de conduta, o mais transparente e vulnerável de todos. E talvez por isso, por ser tão errático, conquistou tamanha empatia e identificação com o público. Pinkman, mais do que nunca, está quebrado tanto mental quanto fisicamente.
Desta forma, “El Camino” fala sobre as segundas chances que a vida nos oferece. Sobre os traumas, as escolhas e as consequências. Juntar os cacos é preciso. Tudo orquestrado por um roteiro impecável - algo característico de Gilligan - que se preocupa em amarrar as pontas, concatenar as ideias, recortar a história pinçando fatos passados que influenciarão o presente e, sobretudo, o futuro de Pinkman. Perceba como a narrativa trata de colocá-lo, volta e meia, recebendo conselhos de figuras icônicas na mitologia do seriado. Como se cada um, em algum momento e ao seu modo, quisesse guiar o anti-herói para um recomeço.
Claro que a maturidade, ou falta dela, vai fazê-lo enxergar e encarar cada possibilidade de maneira distinta. Enquanto um indicava um local ideal para recomeçar, outro propôs cursar uma faculdade como uma oportunidade de mudança de vida; e assim por diante. Mas somente Jesse saberá qual o caminho seguir no final das contas. E não é exatamente assim que acontece na nossa vida?!
A montagem dinâmica e não linear, por
sua vez, também é outro destaque. Transitando entre as linhas temporais com
imensa organicidade, a edição salta de um ponto a outro através de cortes
elegantes e raccords que se apegam a locais, objetos de cena e situações em
comum. O espectador se vê num quebra-cabeça nostálgico presenciando momentos
importantes da vida do protagonista num vaivém de emoções. As atuações, por
sinal, continuam primorosas. O elenco está bem à vontade na retomada de um
universo tão aclamado. Paul aparenta tranquilidade e intimidade no reencontro
com o seu alterego.
Toda aquela atmosfera de Breaking Bad
continua intacta e referenciada. O misto de visceralidade com suavidade, cada
qual ganhando o seu protagonismo na hora certa. O tato do autor em abordar os
dilemas, as saídas mais coesas. As rimas visuais capazes de estampar o estado
de espírito dos personagens sem precisar dizer uma palavra sequer. Os ângulos
meticulosamente pensados, as câmeras colocadas nos locais mais insólitos, a
quebra do maniqueísmo apresentando personas em "tons cinzas", fugindo
dos estereótipos, além de uma fotografia rebuscada. Está tudo lá! Um deleite
para os fãs. Assim, voltei a sentir aquela sensação prazerosa, “viciante”,
semelhante a de assistir aos episódios, à época. E o melhor, sem precisar de metanfetamina
pra isso.
Yo bitch!
*Avaliação: 4,5 Pipocas + 5,0 Rapaduras = 9,5.