sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

MATRIX RESURRECTIONS

 

Por Rafael Morais (um Neo procurando se encontrar)
24 de dezembro de 2021

Retomar a resenha de críticas fílmicas, após um bom tempo parado, representa a escolha pela “pílula vermelha”. É sobre sair da zona de conforto e encarar a verdade inevitável: o meu amor pelo Cinema precisa ser externalizado de alguma forma. E reiniciar justamente numa continuação de Matrix, uma daquelas obras que moldaram o cinéfilo moderno, é emblemático.

Considerada um jovem clássico, a icônica película de 1999 arrebatou o coração do público e arrancou os aplausos da crítica se arrastando por mais dois longas que, nem de longe, alcançaram o brilho e a inventividade do original. Pena que não foi diferente aqui em “Resurrections”.

Apesar de estar claramente refém de sua masterpiece, Lana Wachowski - desta vez sem a habitual parceria de sua irmã – soube, em parte, revisitar o universo já estabelecido, fugir das convenções, modernizar o texto e manter o espírito do cultuado primeiro filme; mas, infelizmente, esta continuidade de “Revolutions” desperdiça as principais características da franquia ao não caprichar nas cenas de ação, poucas e esquecíveis. Com exceção da sequência final na moto pela cidade - George Romero vive!

Ok, entendo que o subtexto guarda uma crítica ácida e direta à indústria do entretenimento como um todo, sobretudo à hollywoodiana, ocasião em que o roteiro se utiliza da metalinguagem para conseguir este fim. A sanha dos produtores pelo próximo episódio, de sugar o “mais do mesmo” até a última gota sem se importar com a criatividade, muito menos com o ineditismo. Sim, comprei essa ideia de não me servirem o mesmo produto reembalado com uma nova skin

Mas o problema é que o filme abraça essa autoanálise e se rebela até mesmo contra o próprio conceito que o tornou tão memorável. Não espere por coreografias mirabolantes. Nem a fotografia é condizente sequer com a trilogia. A cineasta não esconde a falta de tesão em filmar ação, se apegando mais ao conceito (o propósito, o plot, a ideia) da nova empreitada de Thomas Anderson/Neo (Keanu Reeves) em busca de Tiffany/Trinity (Carrie-Anne Moss) do que propriamente com os meios para se chegar lá. O clímax, portanto, restou prejudicado pela malfadada troca do imagético pelo verborrágico.

Neste prisma, a utilização de câmera na mão, por exemplo, é uma quebra brusca no estilo já consagrado. Antes os slowmotion’s enchiam os olhos do público. Cada bala, cada soco era captado com precisão. A misancene rebuscada era uma marca registrada. Agora, temos uma bagunça visual indescritível. Tudo parece meio brega, e o pior: é proposital. É um blockbuster que não quer se assumir como tal e se autossabota em troca da “moral da história”.

Confesso que até o meio da projeção estava correndo tudo bem com o andamento da história em si. Comprei os conceitos, me diverti com algumas falas. Contudo, é da metade do segundo ato até o desfecho que as coisas fogem do controle. Os personagens não param de falar rapidamente, um segundo sequer, tornando uma experiência autoexplicativa para Christopher Nolan nenhum botar defeito.

Um simples recorte de uma cena ilustra bem essa situação. Durante uma exaustiva reunião em um cacimbão (sim, isso mesmo), no intuito de bolar um plano para resgatar Trinity, os novos integrantes, em parceria com os já conhecidos, tramam um projeto estapafúrdio e complexo. Por um momento ouvi na minha cabeça a trilha sonora de “Missão Impossível” tamanha a articulação do plano. Divagação à parte, voltando ao que “interessa”, um deles pergunta a Neo se ele concorda e se estava entendendo todo o passo a passo do que deveria ser feito, momento em que ele responde: “Não entendi nada”.

Ora, o protagonista falou pelo público. Não adianta vomitar informações sem se preocupar com a sincronicidade da imagem, do conceito apresentado. Principalmente quando falamos de sétima arte.

Falando assim até pareço um bot da Matrix enfatizando o discurso e alimentando a ideia para essa continuação.

Mas vamos deixar as amarguras de lado porque nem só de desgraça vive "Resurrections" e, como havia dito, eu tomei o comprimido encarnado. Ponto positivo para a química entre Reeves e Anne Moss. O casal esbanja uma sinergia digna daquela que o script propõe. Do mesmo modo, o talentoso Yahya Abdul-Mateen II encarna um inusitado Morpheus rebootado com a resposta pronta para a troca de casting. Gostei de Laurence Fishburne surgir reverenciado, acertadamente. O mesmo não se pode dizer (...vixe, lá vem ele de novo) de Jonathan Groff como antagonista. Não senti o carisma e a presença de cena marcante como a de um Hugo Weaving, por exemplo. Não mesmo.

Outro destaque fica para a música White Rabbit da banda "Jefferson Airplane". A linda canção martela no juízo do espectador ao se moldar perfeitamente na história proposta fazendo clara alusão à narrativa de "Alice no País das Maravilhas", uma das referências escancaradas de Matrix. 

Enfim, entre mortos e feridos; entre a nostalgia e o novo, quase todos se salvaram.

NOTA: 3,5 Pipocas + 4,0 Rapaduras = 7,5

Nenhum comentário:

Postar um comentário