Rafael Morais
18 de junho de 2012.
Antes de qualquer coisa, vale ressaltar que muitos críticos estão "descendo a lenha" nesse novo trabalho de Ridley Scott - o cineasta não filma um Sci-Fi desde Blade Runner (1982) - como se esperassem um reboot de Alien - O Oitavo Passageiro (1979). Na verdade, o que se aproveita aqui em Prometheus é muito mais o universo da franquia, do que propriamente o roteiro ou o gancho com as outras fitas. A bem da verdade é que de prequel de Alien o filme não tem nada. Sabemos que Prometheus está longe de ser um
desses trabalhos mais conceituados de Scott, mas também não pode ser visto com
um olhar indiferente/torto, como anda acontecendo.
Presenciamos o retorno de Scott à ficção científica voltada para a ação, coisa que ele sabe fazer muitíssimo bem. A ambientação é marcante e, mesmo que o público médio não perceba, é levado a reconhecer esse ambiente. Deixando os efeitos especiais arrebatadores apenas para quando são necessários - é tanto que o elenco do filme se surpreendeu com os cenários/objetos de cena realistas, feitos à mão, sem necessariamente utilizar-se das técnicas de CGI (computação gráfica) - há muitos cenários sendo feitos em estúdio de maneira convincente, à moda antiga, resgatando um tipo de ficção que não se faz mais, suja, explícita, escura, caótica, sem frescuras, onde a automação ainda não é regra, e os humanos são indispensáveis ao funcionamento dos maquinários, acompanhando a tecnologia. Méritos para a direção de arte ao refletir o perfeccionismo e o carinho do cineasta para com a franquia.
Aliás, tecnicamente, não há nada adverso ou desconexo no filme, a não ser a fraca e contida trilha sonora que não acompanha o seu clímax. A fotografia perfeita conecta genialmente os filmes ao recriar aqui a mesma ambientação alcançada lá no final dos anos 70. Mas, como dissemos é apenas uma conexão para situar o espectador no mesmo universo. Contudo, o tipo de abordagem é diferente, os objetivos são diferentes. Não estamos enclausurados em uma nave em busca de sobrevivência (Nostromo), mas sim em um planeta distante da Terra em busca de respostas sobre a existência humana.
A história traz acontecimentos após indícios de que o homem pode ter vindo de uma raça alienígena - o prólogo/introdução é uma bela sequência -, fazendo com que uma expedição embarque na nave Prometheus, seguindo pistas até um planeta distante, onde descobrem perigos que não colocam apenas suas vidas em risco, mas também de toda a humanidade.
Lógico que Scott não é Kubrick - falta bastante feijão com arroz - e muito menos Tarkovsky, mas as inspirações tanto em 2001: Uma Odisséia no Espaço (2001: A Space Odyssey, 1968) quanto em Solaris (Solyaris, 1972) são óbvias. Sem dúvida, Prometheus é muito mais filosófico em seu discurso do que Alien; mais pensativo do que nervoso, e isso cria um clima mais épico, principalmente pelas imagens distantes; fantásticos planos abertos/gerais que mostram naves imensas, que perto de planetas ficam minúsculas, assim como montanhas, chuvas e demais ambientações magníficas. Visualmente, Prometheus é impecavelmente rico e proporciona uma experiência como poucos filmes do gênero conseguem hoje.
O sentimento é de que estamos vendo um trabalho dos anos 80 feito nos dias contemporâneos, com direito a luz contra a lente e tudo, tanto por seu desenvolvimento paciente quanto por suas decisões e personagens.
Apesar de contar com um vasto elenco, há dois nomes que devem ser destacados dos demais. Michael Fassbender é David, o andróide apresentado no começo do filme que auxilia a equipe com informações e tudo o que for necessário. Apesar de estar sempre com um discurso amigável, suas intenções não ficam evidentes, ao menos que você perceba que ele é programado pela Weyland, empresa cujo dono é o personagem vivido por Guy Pearce, um mega-bilionário que não se conforma com a velhice e morte, e financia a incursão da equipe por outras luas em busca de respostas.
Com isso, David se torna o personagem mais complexo e interessante de Prometheus, seja pelos diálogos significantes e confrontantes com os humanos, seja pela falta de alma e excesso de racionalidade. Sua inspiração em Hal 9001 de 2001 é clara e pertinente. Já Elizabeth Shaw (Noomi Rapace) é a nova Ripley e sofre com a sombra da heroína do filme original. Porém, Noomi se sai maravilhosamente bem e convence não apenas como intelectual, mas quando precisa lutar por sua vida – Scott sempre se deu bem com personagens femininas fortes. A sequência da cena da operação é uma das mais tensas do filme, fazendo vários espectadores virarem o rosto.
Já o roteiro, mesmo que problemático, faz uma bela metáfora ao relacionar a mitologia grega de Prometeus: O deus que lutou pelo bem estar dos homens, inclusive dando-lhes o fogo. Descendente dos titãs destronados por Zeus, chegou à terra e descobriu-a abandonada pelos céus, habitada por plantas e animais, mas faltava a criatura que fosse o senhor da terra. Por isso apanhou um bocado de argila e molhou com um pouco de água de um rio e com essa massa fez o homem, à semelhança dos deuses, e pegou as almas boas e más dos animais, animando sua criatura. Traçando um paralelo a isso, repare na cena em que o "Engenheiro", nome dado à raça alienígena, o criador, acorda do sono profundo e constata que o "fogo" foi disseminado pelo ser humano, concebido por ele como sua imagem e semelhança, mas que de forma equivocada/anômala, destrói o seu próprio planeta, não respeita o meio-ambiente e brinca de ser deus ao conceber um robô, David, falante e artificialmente inteligente. Isso causa a ira do Engenheiro, trazendo consequências trágicas.
Encerrando sem fechar tudo o que abriu para discussão, sem acompanhar o grandioso propósito com respostas a altura, Prometheus é uma viagem sensacional que se prende em excesso à parte filosófica, e isso não seria problema se o argumento apresentasse a réplica para as suas teses. Nesse sentido, provavelmente, o resultado irá decepcionar quem espera um discurso um pouco mais profundo. Porém, quando o filme esquece disso, volta a ser aquilo que faz de melhor e que todos esperavam dele: entretenimento eficiente, terror psicológico intenso, abastecido por uma produção impecável e personagens com força para marcar história, percebemos que estamos diante de um épico Sci-Fi, sem sombra de dúvidas.
Homem é homem, macaco é macaco e Prometheus é Prometheus, e não Alien, como assim alguns esperam.
Gostei da referência à mitologia. Por todas as discussões, aliás, mais por elas do que pelo filme, acredito que PROMETHEUS caminha para ser o principal filme da temporada MESMO. Independente de ter sido uma unanimidade.
ResponderExcluir"Megalomaníaco nas propostas, porém, modesto nas respostas. "
hahahaha, boa
Tullio Dias, obrigado pelos elogios cara. É uma honra para mim. Sou muito fã do seu trabalho no Cinemaemcena. Toda semana escuto os podcats e morro de rir com as suas opiniões. Valeu mesmo! Abç!!
ExcluirParece muito interessante!!! gostei muito da dica!!!
ResponderExcluirValeu, Jôana Araripe. Fica a dica!
ExcluirBelíssima resenha doutor! Realmente quem estiver esperando um novo filme da Franquia alien, vai se decepcionar, pois apesar de se passar no mesmo universo, o filme tem uma temática bem diferente, muito mais profunda e especulativa, respondendo algumas duvidas deixadas pelo alien, mas trazendo muitas outras. O certo e que se trata de um excelente filme, com boas atuações e um visual espetacular, quem gosta de sci-fi deve assistir com certeza!
ResponderExcluirExcelente comentário, doutor. Obrigado pela participação e pelas observações. Forte abraço!
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