sábado, 27 de agosto de 2011

EM CARTAZ: SUPER 8


J.J. Abrams homenageia o seu mentor Spielberg de forma nostálgica.
Rafael Morais
27 de agosto de 2011.

Que Steven Spielberg não faz um grande filme há um bom tempo, é uma verdade inquestionável. O seu estilo ímpar de filmar/dirigir/criar parece ter se resumido à produção. Mas, um pupilo que poucos imaginavam, J.J. Abrams (Lost, Missão Impossível IV, Cloverfield), deu as caras e prestou uma bela homenagem ao cinema com esse ótimo Super 8.
Escrito e dirigido por Abrams, o longa é um baú de referências "spielberguianas", pois podemos encontrar uma trilha sonora heróica e um núcleo formado por crianças carismáticas.  A marca do cineasta parece está impressa em cada detalhe das cenas, como o uso constante de bicicletas como meio de transporte dos jovens (E.T.), a inocência da infância (Os Goonies) e principalmente, aqui em Super 8, o modo de esconder o monstro e sugerir o medo através de sombras, destruições e sons horripilantes, como fez em O Tubarão, quando, durante todo o filme, Spielberg brincou com a imaginação do espectador, propondo o medo para só depois explicitá-lo. 

A trama se passa no verão de 1979, quando um grupo de seis garotos, em uma cidade industrial de Ohio, testemunha uma catastrófica colisão noturna de um caminhão com um trem de carga. Tudo é registrado com uma câmera Super-8 (daí o nome do filme) com a qual estavam tentando fazer um filme. Não tarda para que a turma de amigos comecem a desconfiar que aquilo não foi um acidente casual.
Nesse contexto, traçar um paralelo com os dias atuais é algo recorrente durante a projeção, uma vez que o filme se passa na década de 70 e à época as informações eram raras, diferente de hoje em dia, que os jovens acreditam saber de tudo, "bombardeados" de informações, cheios de fórmulas e respostas prontas para tudo. Em Super 8, a infância era vivida, a informação era algo precioso, o excesso dela não existia. Um menino, Joe (Joel Courtney), perdeu a mãe e não sabe por que, não compreende como o seu pai odeia tanto um vizinho, e entende menos ainda quando o exército dos EUA invade a sua cidadezinha de Ohio após um acidente de trem que Joe teve o acaso de testemunhar.
O núcleo jovem ganha muito com a brilhante atuação de Elle Fanning como Alice. A adolescente com capa de durona, desabrocha toda a sua sensibilidade nos momentos mais tocantes do longa. É de impressionar como uma atriz estreante em cinema consegue passar de uma cena altamente dramática e conflitante para um ato de suspense e medo. Aliás,  a versatilidade do grupo infantil foi bem trabalhada pela direção de elenco. Não menos importante é o design e a direção de arte que constroem com eficiência o período enfocado e todos os detalhes de objetos de cena e os figurinos.
Quanto aos efeitos visuais, a produção é competente na medida do possível e, às vezes, exagera um pouco na sombra e escuridão, mas não compromete o resultado. Méritos para a cena da explosão do trem. Impecável! Os efeitos sonoros detalham cada plano, nos remetendo àquela sequência de deixar qualquer um boquiaberto. O único problema nesse tocante é o exagero como Abrams utiliza os seus famosos flares - reflexos luminosos que se tornaram uma assinatura do diretor - o cineasta tem uma necessidade de encaixar essa luz refletida em quase todas as cenas. 
Voltando ao roteiro, ser criança nesses tempos não significava não ser rebelde, e aí entra a figura da autoridade, o pai de Joe é um policial amargurado por ter perdido recentemente a esposa. Os conflitos entre pai e filho são inevitáveis, encorpando, sobremaneira, a carga dramática do filme. 
Abrams já tinha a fórmula do sucesso e, querendo estimular a curiosidade, pesou a mão no mistério. Nesse campo, o longa adquire um ar de suspense inteligente e jocoso, já que a criatura que escapou do trem atormenta a pequena população através de vultos que surgem em reflexos na água, encobertos por objetos, remexendo os arvoredos, enfim está escondida e ninguém sabe que horas aquilo vai aparecer. Em oposição, a ocupação do exército é absurda; os tanques de guerra invadem a cidade e todo o Scope de Super 8, embora mal passem nas ruas apertadas.
A revelação do monstro e a consumação do potencial bélico encerram o suspense e concedem ao filme uma apoteose de lampejos, raios, fumaça e explosões que lembram as cenas de ação conscientemente exageradas de O Último Grande Herói, outro exemplo de metalinguagem para os leigos. E aí fica claro, nesse clímax, que Super 8 é um filme de cinefilia não só na sua premissa, não só na reverência à Amblin (produtora de E.T. e Goonies), mas de ponta a ponta - entrega-se sem medo ao suspense com a mesma disposição com que se entrega, depois, ao filme de ação. Porém, ao entrar no desfecho, o roteiro parece desidioso ao resolver rapidamente os conflitos que os personagens adquirem. Quando alguém está em perigo, quase que instantaneamente, acha-se a resolução perfeita. Estranhei um pouco.
Contudo, é notável a sensibilidade de Abrams ao tratar sobre temas delicados, como o falecimento da mãe de uma criança, conflitos entre pai e filho, o primeiro amor, entre outros. Outrossim, a maneira de como "tocar" o público escolhida pelo cineasta é magnífica, seja nos olhos humanizados do monstro, seja no escapulário com a foto da mãe do pequeno Joe, quando ele deixa ela ir/escapar como forma de superar o passado e avançar para uma nova fase da sua vida. Simplesmente tocante.
E é isso que torna Super 8 um autêntico filme, pois respeita a arte e seus processos, sem preconceito com gêneros, não sendo,  meramente, um filme de mimetismo.

     

Nos créditos finais, podemos assistir ao curta rodado pelas crianças. Original e imperdível!


  

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