Trazer de volta uma história tão querida quanto 'Como Treinar o Seu Dragão' é, no mínimo, um ato de ousadia. A trilogia animada marcou uma geração — não só por seus voos emocionantes e dragões carismáticos, mas por falar sobre crescimento, perdas, coragem e conexão. Agora, o desafio foi ainda maior: transformar esse universo mágico em algo real, quase palpável. E foi exatamente aí que o live action encontrou seu maior triunfo.
Sob a direção de Dean DeBlois, o mesmo nome por trás da animação original, o filme ganha uma nova roupagem sem perder a alma. A escolha por manter a essência dos personagens, da mitologia e das emoções foi sábia. Mas há algo de diferente aqui — algo mais maduro, mais cru, mais próximo.
Revisitar essa história ao lado do meu filho, agora pré-adolescente, foi especial de um jeito difícil de descrever. Nossa jornada com a franquia começou de forma pouco convencional: assistimos primeiro ao terceiro filme da animação, quando ele tinha apenas quatro anos. Fomos fisgados de trás pra frente — e isso só prova o quanto essa história tem força, não importa por onde se começa.
Naquela época, ele ria alto com as travessuras do Banguela e se empolgava com os voos de Soluço. Desta vez, no entanto, o silêncio dele falou mais do que as palavras. Ele assistiu com um olhar diferente, mais atento, mais tocado. Se emocionou em vários momentos. Talvez porque agora entenda melhor o que é crescer, sentir medo, mas continuar — com coragem, com afeto, com os vínculos que nos seguram quando o mundo parece grande demais.
O elenco ajuda a manter essa conexão ainda mais viva. Mason Thames, no papel de Soluço, é uma grata surpresa — entrega a vulnerabilidade do personagem com autenticidade, sem perder a curiosidade e a bravura que sempre definiram o protagonista. Nico Parker, como Astrid, equilibra força e leveza com naturalidade, construindo uma presença marcante e afetuosa. E é impossível não destacar o “sempre galã” Gerard Butler como Stoico. Sua presença impõe respeito, mas também traz calor emocional às cenas mais delicadas entre pai e filho. Juntos, o trio dá vida a relações que amadurecem diante dos nossos olhos — refletindo, com sensibilidade, as mudanças que também vivemos ao longo da vida.
O humor continua presente, naturalmente — e cumpre bem o papel de suavizar a narrativa nos momentos certos. Mas o verdadeiro coração da história sempre foi o vínculo. A amizade improvável entre um garoto e um dragão, que à primeira vista parecia impossível, permanece sendo o motor que move tudo. Só que agora ela vem com uma nova camada, mais madura, mais profunda. O filme nos lembra, com delicadeza, que até nas conexões mais inesperadas existe espaço para confiança, respeito e afeto genuíno. E é justamente isso que faz essa história continuar tão poderosa.
A fotografia é um espetáculo à parte. As paisagens naturais, com seus penhascos recortados, o mar agitado e o céu encoberto por nuvens densas, criam uma atmosfera que equilibra com delicadeza o épico e o íntimo. A Ilha de Berk, antes vibrante e colorida na animação, agora se apresenta selvagem, imponente e quase solitária, como se estivesse mais próxima do mundo real. Cada enquadramento parece esculpido pela própria natureza, revelando uma beleza crua e cativante . A fotografia não apenas compõe o cenário — ela intensifica a experiência emocional, tornando tudo mais palpável, mais próximo, mas sem jamais abrir mão do encanto da fantasia.
'Como Treinar o Seu Dragão' em live action não é apenas uma nova adaptação — é um reencontro. Com a história, com os personagens e, de certa forma, com aquilo que nos fez encantar por esse universo desde o início. A nova versão resgata a essência da animação e a apresenta com um olhar mais realista, mas ainda preserva o charme e a sensibilidade que tornaram a saga tão especial. Uma prova de que histórias bem contadas permanecem vivas — e continuam conquistando espaço no coração de quem as acompanha.