Guillermo del Toro sempre enxergou os monstros de um jeito diferente.
Em vez de se deter nas formas e nas deformidades, ele busca o que existe por trás delas — a humanidade, o medo e o afeto escondido sob a pele.
Em Frankenstein, ele retoma esse olhar e transforma o clássico de Mary Shelley em algo mais íntimo: uma história sobre o impulso de criar e o preço de fazê-lo.
Victor Frankenstein, interpretado por Oscar Isaac, não é o cientista enlouquecido de outras versões. É um homem que cria para preencher o vazio, tentando dar sentido à própria solidão. Sua busca pela perfeição se confunde com a incapacidade de aceitar seus próprios limites.
Jacob Elordi, como a Criatura, é o reflexo desse erro. Ele nasce sem culpa, mas é condenado pelo abandono. É um corpo forte com uma alma frágil — e cada olhar carrega o peso de quem foi feito, mas nunca amado.
Entre os dois se constrói a verdadeira tragédia: o criador foge daquilo que fez, e o ser criado busca entender por que existe. Del Toro filma essa relação com calma, deixando o desconforto crescer em silêncio. Não existe vilão, apenas a dor de reconhecer-se no outro.
A fotografia de Dan Laustsen reforça essa ideia. Os tons frios e as sombras longas criam distância, não medo. O visual gótico é elegante, quase contemplativo. Tudo parece girar em torno da culpa — de quem cria e de quem foi criado.
O elenco é preciso. Oscar Isaac entrega um Victor contido, dividido entre o orgulho e o arrependimento. Elordi transforma a Criatura em um ser vulnerável e humano. Mia Goth e Christoph Waltz completam o elenco com atuações que equilibram razão e emoção.
Del Toro preserva o espírito do romance de Shelley, mas fala com a voz do presente.
Se no século XIX o homem tentava ser Deus através da ciência, hoje ele tenta fazer o mesmo através do controle.
O resultado é um filme que não busca sustos, mas reflexão.
Frankenstein é menos sobre monstros e mais sobre o que fazemos com o que criamos.
É sobre o medo de amar o que não compreendemos — e o risco de negar o que se parece demais conosco.
E talvez entender que o verdadeiro monstro pode nao ser quem nasce... mas sim quem abandona.
