Por Rafael Morais
Nova “dramédia” de Alexander
Payne é um filme de natal diferente das galhofas do gênero que você encontra
facilmente ao remexer os streamings da vida.
A trama segue a
desventura de um professor mal-humorado (vivido pelo excepcional Paul Giamatti)
de uma prestigiada escola americana, forçado a permanecer no campus para cuidar
do grupo de alunos que não tem para onde ir durante as festas de fim de ano. Assim,
o mestre carrasco acaba criando um vínculo improvável com um deles – um
encrenqueiro magoado e muito inteligente – e com a cozinheira-chefe da escola,
que acaba de perder um filho no Vietnã.
Logo de início, é fácil
constatar a semelhança, quase homenagem, de Payne à filmografia de John Hughes,
sobretudo ‘Clube dos Cinco’. A familiarização fica notória quando vemos uma turma
de adolescentes (e no início são justamente cinco) tendo que ficar mais tempo
do que o esperado na escola, cada um com os seus motivos e personalidades
diferentes.
Claro que essa aparência
com as fitas de Hughes logo se dissipa quando o filme começa a deixar claro
sobre o que quer falar. Inspirado em ‘Merlusse’, longa francês dirigido por
Marcel Pagnol em 1935, ‘The Holdovers’ (traduzido aqui como ‘Os
Rejeitados’) está mais preocupado no estudo dos seus personagens e entender o
motivo pelo qual cada um está naquele estado de espírito, do que propriamente com
a comédia casual ou situações inusitadas de jovens dentro de uma
escola/internato. Aqui, a ironia vence a gag.
Emocionante, e com arcos narrativos bem delineados, o filme acerta na construção de amizades improváveis e na desconstrução das crenças dos seus personagens. Paul Giamatti brilha demais ao entregar a alma de sua persona ao espectador. Complexo, o professor, de cara, causa ranço, mas aos poucos baixa a guarda e traz humanidade. Tomado pelo tom de cinza, sem espaço para o maniqueísmo, o filme aborda uma “simbiose” entre mentor e aprendiz para falar sobre os relacionamentos entre pais e filhos: sejam aqueles negligenciados ou doloridos pela perda.
A empatia, elemento habitual dos filmes de Payne,
aqui ganha um charme diferente ao abordar a relação de admiração e poder entre
mestre e pupilo. E quanto um professor pode ser importante, de diversas
maneiras, na vida de um aluno. O longa parece querer “colar” os relacionamentos
quebrados e isso traz um aconchego ao público. Ao final, ‘Os Remanescentes’ (caso
fosse traduzido literalmente) é sobre bondade (em tempos de cólera), amparo e
maturidade. É um grupo que remanesce/sobrevive às intempéries da vida e entende
que o fardo pode ser mais aliviado ao conhecer melhor quem está no “mesmo barco”
que o seu.
A reunião de um professor
“caxias”, quase amargurado (e ele tem lá seus motivos); um aluno dono de um
olhar perdido, que pede ajuda de diversas maneiras, deixado de lado pela família
(justo no natal) – e a cena em que ele remexe um globinho de neve simboliza bem
a confusão mental de sua autoestima e dos seus sentimentos - e uma mãe que
perdeu um filho recentemente, demonstra que todos eles têm mais em comum do que
se imagina.
Avaliação: 3,0 Pipocas + 5,0 Rapaduras = 8,0.