segunda-feira, 18 de setembro de 2017

NOS CINEMAS - Atômica

Por Rafael Morais
18 de setembro de 2017

Charlize Theron está cada vez mais furiosa, diz o cartaz. E isso não é só uma referência direta à sua personagem em “Mad Max: Estrada da Fúria”, uma vez que a atriz vem escolhendo papeis cada vez mais badass. E aqui em “Atômica” não é diferente. A parceria com o diretor David Leitch (corresponsável pelo excelente John Wick) rendeu uma ótima obra de ação, podendo decepcionar quem estiver esperando um filme de espionagem puro. A trama é bem simples: perto da queda do muro de Berlim, EUA, Inglaterra, França e União Soviética disputam informações privilegiadas quando um agente da MI6 é assassinado e tem uma importante lista roubada.

Assim, Lorraine Broughton, a agente especial vivida por Theron tem uma missão principal e uma side quest bem delineada:  resgatar a lista e identificar o agente duplo de nome Satchel é o seu mister. Neste sentido, a película tem um primeiro ato sofrível quanto ao ritmo da narrativa, vindo a melhorar drasticamente nos seus demais atos. Banhado por uma fotografia dessaturada, guardando na utilização de néons com cores quentes e vivas, fazendo assim uma quebra do tom cinza, gélido e azulado que impera, sobretudo, na Alemanha Ocidental, Atômica acerta em cheio na ambientação diferenciando com precisão ambos os lados do muro. Especialista em coreografia de lutas, Leitch consegue aprimorar a fórmula de "De Volta ao Jogo", como no impressionante plano-sequência que se inicia durante uma pancadaria na escadaria, finalizando com uma alucinante perseguição de carro. Sem cortes aparentes, este plano longo lembra aquele que vimos no magistral “Filhos da Esperança” de Alfonso Cuarón, por exemplo, tamanha a complexidade da continuidade da ação, ininterrupta, de quase uns 20 minutos.

Outro show à parte é a excepcional trilha sonora que casa com a época. Os anos 80/90 são representados por bandas que vão de New Order a Queen (Under Pressure oferece uma catarse sonora) e as músicas equalizam as cenas ao passo que marcam o ritmo das ações. Sem oferecer glamour à figura do espião, a maquiagem soa orgânica ao auxiliar na desconstrução da "heroína", expondo os hematomas, as feridas e as marcas deixadas a cada embate. Demonstrando ter uma boa base cinematográfica, Leitch referencia o diretor russo Andrei Tarkovski, diretamente, através dos cartazes do filme “Stalker” espalhados pelo cinema quando Lorraine enfrenta os seus inimigos. Se em Stalker a queda de um meteorito cria um local onde os sonhos se realizam, porém, ambientes este restrito apenas a alguns (chamado de Zona e quarto), aqui em “Atômica” a metáfora é emprestada com a queda do muro e as consequências político-sociais.

Visualmente impecável e explorando a violência gráfica, o longa reserva cenas de ação clássica como aquela em que Lorraine enfrenta um russo em contraluz, por detrás da tela de um cinema. Não menos interessante, o elenco entrega interpretações convincentes, sobretudo o David Percival do performático James McAvoy. Sujeito estranho, camaleônico e complexo, o agente conhece os lados opostos de Berlim, como a palma da sua mão, tornando-se um típico produto do meio. No mais, apesar de um roteiro raso, desprovido de mistério, “Atômica” funciona enquanto filme de ação e ratifica ainda mais o posto de Charlize como uma atriz versátil e ícone “Girl Power” da nova geração.

*Avaliação: 4,0 pipocas + 3,5 rapaduras = nota 7,5

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