Por Rafael Morais
06 de setembro de 2016
Uma trilogia se fecha ao passo que um universo de
possibilidades se abre: essa é a sensação deixada após a sessão de "Star
Trek - Sem Fronteiras", ratificada pelo próprio subtítulo. O segredo do
sucesso no ressurgimento da franquia pode residir, entre diversos fatores, na
química do elenco formado por um seguro Chris Pine, cada vez mais à vontade no
seu Capitão Kirk; um Zachary Quinto sempre inspirado, que constrói o seu Spock
com a complexidade necessária de um ser meio vulcano, meio homem; sem esquecer
os demais integrantes da Enterprise: como o carismático Sulu (John Cho), o
russo Chekov (Anton
Yelchin, precocemente falecido após as filmagens), Uhura (Zoe Saldana),
o engenheiro Scott (Simon Pegg, também responsável pelo roteiro), fechando com
o doutor “Magro” (o polivalente Karl Urban) o alívio cômico sempre bem-vindo. A
propósito, o humor está bem empregado durante toda a película, seja através de
gags visuais ou diálogos expositivos.
Neste episódio, a tripulação da
Enterprise encontra-se no terceiro ano da missão de exploração do espaço
prevista para durar cinco anos. O ato de humanidade do capitão Kirk, curioso
por novas descobertas (o que move toda a trilogia), põe toda a tripulação em
perigo ao atender a um pedido de socorro, o que acaba os ligando ao vilão Krall
(Idris Elba), um insurgente, anti-Frota Estelar, interessado em um objeto de
posse do líder da nave. Com o ataque à Enterprise (não é spoiler, está nos
trailers) todos vão parar em um planeta desconhecido, onde o grupo acaba sendo
dividido em duplas.
Sendo assim, o roteiro sagaz de Simon Pegg é simples, mas
não simplista, sendo evidenciado pelo ótimo ritmo imposto ao longa. E a ideia
de dividir a turma em duplas confere uma dinâmica à montagem, ainda sobrando tempo para nos apresentar a novos personagens, como a exótica guerreira
Jaylah (Sofia
Boutella). Se durante as eficientes cenas de ação, a
pancadaria nos prende à tela, quando há uma pausa para desenvolver os
personagens, o filme consegue, com o mesmo êxito, envolver o público a se
importar com o destino dos protagonistas. E por falar em ação, o diretor Justin
Lin, que já comandou um capítulo da franquia "Velozes e Furiosos",
põe toda o seu know-how à disposição e manda ver no tiro, porrada e bomba,
literalmente. Pena que nas sequências iniciais de ação, a escolha por
coreografar as lutas tão de perto, praticamente em close-up, confunde a
geografia da cena, fazendo com que o espectador se perca e não saiba sequer
quem levou um soco, deixou cair a arma, ou até mesmo quem morreu. Talvez o uso
de uma panorâmica, ou ângulos mais abertos, aqui e acolá, como fez o brilhante
antecessor J.J. Abrams, fosse a decisão mais acertada.
Sorte que do 2° ato em
diante o idealizador parece acertar na misancene, bem como no equilíbrio das
cores. Perceba a excessiva escuridão nos takes que se passam à noite: com o
passar da projeção a saturação vai se corrigindo e a fotografia, agora ajustada
com a paleta, vai tornando o filme cada vez mais bonito. Por outro lado, a música
Sabotage dos Beastie Boys, pontualmente inserida durante a catarse, rouba a
cena na melhor e mais empolgante sequência do cinema 2016, até agora. Será que
ainda há chance do Rock’n Roll “salvar o universo”?
Mas como dizem os fãs da
mitologia de Star Trek desde a antológica série de TV (e confesso que não me incluo
nesse seleto grupo), é no conteúdo
científico, no tom familiar, leve, mas não menos inteligente e ávido por
exploração que o universo trakkie se interessa. Dentro desse contexto, a
emocionante homenagem a Leonard Nimoy (o eterno embaixador Spock da série
clássica), não só reverencia o original, mas mira o futuro demonstrando respeito ao cânone estabelecido. Aqui, o apelo comercial não tem
vez, embora o sucesso de renda nas bilheterias dite se haverá ou não mais
capítulos rumo à fronteira final, se é que ela existe. Por enquanto,
fico na torcida por mais diários de bordo da frota estelar...
*Avaliação: 4,5 pipocas + 4,5 rapaduras = nota 9,0.