Por Rafael Morais
04 de julho de 2016
Continuações não fazem parte do cotidiano da Pixar, basta ver
a sua filmografia. Talvez por isso, este “Procurando Dory” se pareça tanto com
o seu antecessor enquanto estrutura. Perceba que os atos são divididos da mesma
forma: a apresentação, o conflito e a resolução se assemelham em tudo. Presenciar o conflito de Dory, idêntico ao de
Marlin, quando procurou o seu filho Nemo, soa repetitivo, quase desnecessário.
O impulso nostálgico nos carrega às salas de cinema para testemunhar a jornada
da personagem-título em busca de sua família. O fato de Dory sofrer de perda de
memória recente, trunfo do primeiro filme, a torna “humana” e ganha o público,
tanto que conquistou o seu filme solo.
Desta vez, comprometida em descobrir as
suas origens, a protagonista ganha as “ajudas” de Marlin e Nemo para achar os
seus pais. Contudo, o roteiro empalidece as participações dos peixes-palhaço a
tal ponto de, em certos momentos, esquecermos que fazem parte do longa, por
incrível que pareça. Faltou ousadia à Pixar em apresentar algo totalmente novo,
embora advindo de uma sequência.
Entre os inéditos personagens, os destaques
ficam por conta do leão marinho Geraldo (hilário na sua composição), a estranha
ave Beca e o polvo Hank (na voz de Antonio Tabet do “Porta dos Fundos” e “Kibe
Loco”), que rouba a cena - e não duvido que outro spin-off venha por aí. Hank cumpre
um arco dramático que faz falta a outros personagens no filme, entre eles a
própria Dory. O polvo carrega uma amargura na voz, bem como nas suas atitudes, evidenciando
a complexidade de um sujeito conformado, meio depressivo pela perda de um dos
tentáculos, tudo diante do comodismo dentro do laboratório em que vive: o Instituto de Biologia Marinha de Marília Gabriela (sim,
a apresentadora. WTF!!) que cuida de animais marinhos em tratamento, seja por
alguma deficiência ou readequação à natureza. Aqui, o argumento tenta
acrescentar um pano de fundo interessante à trama, quando trata das limitações
e necessidades especiais dos bichos, porém, infelizmente, não sai da superficialidade,
com o perdão do trocadilho, desperdiçando um imenso potencial.
O roteiro,
também escrito pelo diretor Andrew Stanton (“John Carter – Entre Dois Mundos”),
peca por não abraçar o “road movie” (ou seria “sea movie”?) como subgênero para
narrar esta história, o que acaba soando episódico. Voltar com queridos
personagens como a tartaruga Crush, por exemplo, em uma aparição relâmpago, sem
acrescentar nada à história, só para deixar o público confortável, em terreno
seguro, denota a insegurança de Stanton em mexer com uma das animações mais
queridas do grande estúdio. Não menos desastrosos são os constantes flashbacks
a que somos submetidos, confirmando a fragilidade do script.
Entretanto, não
foi tudo por água abaixo (outro trocadilho infame, desculpem), pois, o carisma
e envolvimento dos personagens, além da introdução das novas figuras que já
mencionei, conseguem trazer lampejos em comparação às produções anteriores.
Belamente fotografada por Jeremy Lasky, a animação nos presenteia com um ballet de
arraias de encher os olhos, em que pese os efeitos 3D serem totalmente
dispensáveis. As cores vibrantes preenchem a tela e hipnotizam adultos e
crianças. Repare que a aquarela alegre surge em sequências apropriadas, dando o
tom de leveza à película, porém, quando necessita, somos mergulhados em uma
paleta mais sombria, que retrata a melancólica imensidão do oceano como uma metáfora
da nossa vida, sobretudo quando Dory luta para não se esquecer de tudo e de
todos, contrastando poeticamente os seus conflitos.
Contando com um
plano-sequência inspirador no 3º ato, “Procurando
Dory” deixa uma sensação estranha no espectador: feliz por reencontrar àquela
turminha marinha adorável, que já faz parte da nossa vida cinéfila há 13 anos, porém,
entediado com a mesmice da abordagem.
*Avaliação: 3,5 pipocas + 3 rapaduras = nota 6,5.