sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

Filme Natalino Obrigatório - A FELICIDADE NÃO SE COMPRA (1946)


Por Rafael Morais
A encantadora utopia de Frank Capra

É algo cada vez mais raro um filme conseguir "sobreviver" durante tanto tempo e envelhecer bem. Em tempos de "besteirois" enlatados, uma obra norte-americana como “A Felicidade Não se Compra”, nos remete à época de ouro do cinema estadunidense, tornando-a sempre bem-vinda e atemporal. 

Dono de um roteiro humanista, escrito a três mãos (Albert Hackett, Frances Goodrich e o próprio Frank Capra), o longa trata de maneira singela, e ao mesmo tempo forte, temas e conceitos humanos bem delicados como: compaixão, solidariedade, honestidade e lealdade. E apesar da produção ser de 1946, a abordagem sobre a ganância humana e a deturpação dos valores se mantém até hoje, e o pior, numa escala ainda mais alarmante. 

A história narra a trajetória de George Bailey (James Stewart, de Janela Indiscreta e Um Corpo Que Cai), um jovem que sonha em crescer na vida, estudar fora, ser um grande homem e ajudar o mundo a ser melhor. Desde pequeno, sempre fez boas ações, assim como o seu pai, como quando impediu que o farmacêutico – e também seu chefe – trocasse o remédio de uma criança por veneno, acidentalmente; além de salvar a pele de seu irmão mais novo em um acidente, vindo a perder a audição de um dos ouvidos. 

George nunca teve intenção de manter a firma de seu pai, um banco bem "diferente" dos padrões: uma instituição financeira idealizada para ajudar as pessoas que necessitavam do dinheiro para progredir, como construir suas residências, por exemplo, mas sem cobrar (e quando cobrava) os tradicionais e exorbitantes juros. O generoso homem sempre quis mais que isso, e narrativa nos apresenta diversas cenas que demonstram esse lado beneficente de George.

Assim, em um certo momento, o protagonista pensa em se suicidar saltando de uma ponte, em razão das maquinações de Henry Potter (Lionel Barrymore), o homem mais rico da região. É nesse momento que Clarence (Henry Travers), um anjo que espera há 220 anos para ganhar asas, é mandado a Terra para tentar fazer George mudar de ideia, demonstrando sua importância através de flashbacks de como seria a vida sem a existência dele. 

E é nesse ponto que o filme aproveita para pôr as cartas na mesa e apresentar os seus temas: o que é melhor, ter amigos ou se aproveitar das pessoas faturando em cima de seus sonhos? Ser leal aos seus valores ou prostituí-los? Enfim, uma coisa é certa, é bem mais fácil ser uma pessoa ruim do que boa, devido às facilidades de trilhar os caminhos errados, cheios de tentação e desprovidos de responsabilidade. 

É impressionante a forma como o genial Fank Capra consegue achar soluções inteligentes e orgânicas para os limitados efeitos especiais da época. Observe na sequência em que Deus conversa com alguns anjos para escalar qual será o escolhido para salvar o pobre George. Ao escolher Clarence, um anjo sem asas (escolha conveniente ao fugir dos CGI’s), o diretor e roteirista deixa claro que os conflitos são inerentes a todos ali, sem exceções. E isso faz com que o espectador se aproxime ainda mais dos personagens. Fantástico!

Vale fazer referência à tocante sequência em que Mary Bailey (Donna Reed) prepara uma surpresa para o seu amado, em plena lua-de-mel. Cena essa de uma sutileza e elegância sem igual. É de arrepiar!       

Em um mundo capitalista dos anos 40, pós-crise de 1929 e o início da reconstrução após a Segunda Guerra Mundial, devíamos refletir em pleno século XXI sobre o que Capra queria nos dizer naquele tempo, sobre os verdadeiros valores da vida. Vale a pena conferir essa obra-prima que se tornou o filme de Natal (fim de ano) obrigatório.

"Lembre-se que ninguém é um fracasso se tem amigos".

*Avaliação: 5,0 Pipocas + 5,0 Rapaduras


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