quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

EM CARTAZ: A PELE QUE HABITO

O Frankstein de Almodóvar.
Rafael Morais
21 de dezembro de 2011.

Quando o médico Robert Ledgard (Antônio Bandeiras) perde sua esposa, vítima de um fatal acidente de carro, esta perda não só deixa problemas na sua vida, como parece ser uma ferida incurável. Depois desse evento traumático, Ledgard se dedica, obsessivamente, a produzir uma pele perfeita, imune à picadas de insetos, à dor e às marcas do tempo, tudo resultado de uma mutação de DNA humano com suíno.

É inevitável pensar, a priori, que o misterioso doutor estava tentando, na verdade, era recriar a sua mulher. Entre tecidos costurados e pensamentos sombrios, aquele homem brincava de deus, enquanto que os seus pares o ameaçavam de estragar a sua brincadeira, entregando-o ao conselho ético da comunidade de médicos. Mas não se engane, nada aqui é o que parece. 

Interessante perceber que o longa tem em sua essência uma fuga aos clichês do gênero, uma vez que Almodóvar revelou que ao adaptar o livro Tarântula, do francês Thierry Jonquet, entregaria um filme de terror sem gritos ou sustos. E é exatamente isso. Um terror dirigido com a elegância de um cineasta ímpar. Imagino que se esse mesmo enredo tivesse caído em mãos "erradas", o resultado faria "inveja" a qualquer Jogos Mortais ou O Albergue. Afinal, a diferença entre o veneno e o remédio é só a dosagem.

O cineasta espanhol e sua equipe são igualmente competentes na escolha do elenco, que traz uma linda e intrigante Elena Anaya ,como Vera, e ainda volta a trabalhar, depois de tantos anos, com Banderas, inspiradíssimo, por sinal. A trilha sonora, por sua vez, não fica para trás, pois, não só imprime o ritmo necessário nas cenas de maior tensão, como também dá o tom da dramática história de Ledgard. Aliás, o dark side do personagem pode ser perfeitamente explicado pelo prisma psíquico, mas jamais pelo lado humanístico.

O que soa estranho nessa genial obra é a forma como o roteiro aborda a relação de Ledgard e o seu irmão, o Tigre. Acredito que a utilização de flashbacks abordando as suas infâncias, ajudaria a formar o elo necessário para entender aquela desastrosa relação fraternal entre os dois. A propósito, brincar com as linhas do tempo e suas respectivas camadas é algo fácil para Almodóvar. Repare na cena em que Vera está deitada, pronta para dormir e um flash/parênteses, interrompe o tempo presente da história e nos remete, subitamente, à um passado sombrio e perturbador, algo inimaginável naquela altura dos acontecimentos. Estarrecedor! 
   
"A vingança é um prato que se come frio", já preconizava um antigo ditado popular. E em A Pele que Habito fiquei durante todo o filme com a angustiante sensação de que a vingança viria, mais cedo ou mais tarde.

Trailer:


Definitivamente, é o tipo raro de filme que nos tira da nossa zona de conforto.
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