"Nada
de Novo no Front", exclusivo da Netflix, é uma adaptação do romance
homônimo de Erich Maria Remarque que narra a jornada do adolescente Paul
Baumer, e seus amigos, convocados para atuar na linha de frente da Primeira
Guerra Mundial. O jovem começa seu serviço militar de forma idealista e
entusiasmada, mas logo é confrontado pela dura realidade do combate. Esta é a
terceira versão desta história. A primeira, de Lewis Milestone, em 1930, venceu
o Oscar de Melhor Filme. A outra versão, de 1979, é a menos conhecida e foi realizada
por Delbert Mann.
Mas
esta nova releitura, dirigida por Edward Berger, tem na bagagem cinematográfica
obras como "Glória Feita de Sangue", do mestre Stanley Kubrick, ao
adentrar e passear pelas trincheiras através do uso de steadicam, por
exemplo. É o aprimoramento técnico de uma fórmula de sucesso. Captar as feições
desesperadas ao passo em que coloca o espectador geograficamente ao lado desses
homens desafortunados na iminência da morte é algo angustiante e aterrador.
Claro
que em "1917" Sam Mendes também bebeu dessa mesma fonte, porém, tentou
ser mais audacioso ao ir esteticamente além e rodar um longa sem cortes através
de take "único", apenas um plano-sequência: disse o marketing.
O pano de fundo era o mesmo: a Primeira Guerra Mundial.
Outra
clara referência contemporânea é "Dunkirk", de Christophen Nolan. A
obra fez escola ao estabelecer um crescente de suspense, sobretudo com a
utilização da espetacular trilha sonora. Assim, à medida em que a tensão aflora, a
música de Volker Bertelmann acompanha o ritmo ao demarcar o tempo, quase como
um tic tac de uma bomba-relógio. Contudo, aqui os acordes remetem aos
horrores da guerra, literalmente. Violinos distorcidos, gritos e tambores secos
entram e saem sem cerimônia. Marchas fúnebres premonitórias são inseridas e
intercaladas escalonando o medo e preparando o público para algo ruim que está
prestes a acontecer. Não há saída para os que vão lutar no front, e o
filme deixa claro isso desde o início.
Prendendo
a nossa atenção do primeiro ao último frame, a película ainda tem espaço
para falar sobre patriotismo inflamado. A exacerbação do discurso desvirtua os
interesses enquanto manipula a massa de manobra. Afinal, a alta patente
uniformizada precisava de material humano para guerrear, muitas vezes sem
propósito algum naquelas trincheiras, sem avançar um centímetro sequer. Havia a
necessidade de amealhar jovens para morrer pelo país e o discurso patriótico
idealizado, por vezes glamourizado, era eficaz como poder de convencimento.
A
verdade é que o tema, por si só, exerce fascínio. Seja por trás das linhas
inimigas, nos campos de batalha ou no “xadrez” estratégico das negociações
(armistício empurrado goela abaixo), a guerra é implacável e não deixará um
legado incólume à humanidade.
Afinal,
para ilustrar bem o argumento faço minha a famosa frase de Erich Hartmann, um piloto de caça
alemão da Segunda Guerra Mundial, o ás de caça de maior sucesso na história da
guerra aérea: “A guerra é um lugar onde jovens que não se
conhecem e não se odeiam se matam por decisão de
velhos que se conhecem, se odeiam, mas não se matam.”
Magnífico,
uma das maiores surpresas que o filme me proporcionou residiu na aproximação com
os elementos de suspense e horror dentro do gênero de guerra. A "terra de
ninguém" devastada é o retrato do caos, do próprio inferno na Terra. É sensacional
a estética empregada por Berger quando trabalha a tensão, utilizando até jump
scares orgânicos. O gore não é evitado, acertadamente. O enquadramento das batalhas é
lindamente fotografado com ares sombrios e sujos, mas não menos contemplativos
minutos antes da saraivada de balas ressoar ou de uma bomba explodir.
Esta
reimaginação do best-seller, já disponível no streaming, é o
candidato da Alemanha para a categoria Melhor Longa-Metragem Internacional do
95º Oscar em 2023. Acho difícil ser superado por outro título.
Por
fim, em "Nada de Novo no Front" os discursos manipuladores, e
atemporais, assustam tanto quanto os horrores das trincheiras enlameadas de uma
Primeira Guerra sanguinolenta retratada de maneira crua e visceral. Imperdível!
*Avaliação: 5,0 Pipocas + 5,0 Rapaduras = 10,0.