Por Rafael Morais
30 de janeiro de 2017
Depois do explosivo “Whiplash: Em Busca da Perfeição”, o
diretor e roteirista Damien Chazelle retorna com esse incrível “La La Land:
Cantando Estações” – de onde tiram tantos subtítulos gratuitos? - calando a
boca daqueles que não acreditavam na continuidade, e, sobretudo na excelência
dos seus vindouros trabalhos, enquanto cineasta, talvez por ser bastante novo,
contando atualmente com 32 anos. Mas Orson Welles não tinha apenas 24 quando
dirigiu e protagonizou o eterno “Cidadão Kane”? O fato é que a idade em nada
tem a ver com o talento, o carisma e o sucesso de um verdadeiro artista.
E
assim chegamos à Los Angeles tão idealizada, representada por uma metáfora em
forma de um longo e belo plano-sequência, já na abertura do filme, onde através
de um enfadonho engarrafamento - dualizado pela ânsia da chegada e pela vivacidade
da juventude retraída dentro de veículos que parecem não sair do lugar -
podemos enxergar a “dura fila” para o estrelato de jovens artistas através de uma coreografia impressionante. Sim,
estamos diante de um musical que homenageia os seus precursores hollywoodianos
em forma de nostalgia e paixão. E por mais que eu tenha certo preconceito com
este gênero, acabei me conectando intensamente com a obra.
O filme narra a
trajetória de Sebastian, o formidável Ryan Gosling na pele de um pianista em
busca de resgatar o jazz na sua essência. O cara sonha em abrir um clube
voltado ao clássico estilo musical, que na sua visão vem morrendo lentamente e
merece uma sobrevida, uma chance para que as novas gerações possam desfrutar deste genuíno som. O que acaba se harmonizando, metalinguagicamente, com o próprio gênero
cinematográfico, musical, abordado. Perceba o discurso do amigo de Sebastian,
vivido pelo cantor John Legend (já ganhador do Oscar pela canção original do
filme “Selma”), quando, tentando convencer o pianista a fazer parte de uma nova
banda pop, indaga mais ou menos isso: “como você quer reviver o jazz se toca
apenas para meia dúzia de pessoas, com mais de 90 anos de idade, num clube
qualquer? Apresente-o a uma nova geração, com uma nova roupagem”. E é
exatamente isso que “La La Land” faz! As referências aos grandes clássicos
musicais do cinema americano estão ali, na nossa cara, mas nem por isso
Chazelle se perde apenas no reverenciar. É simples, mas, emocionante, por
exemplo, ver Ryan Gosling abraçar discretamente um poste de luz branca, em
formato de globo, durante um número, tal qual Gene Kelly em “Dançando na
Chuva”. Ponto também para a caprichada direção de arte.
Desta maneira, o
idealizador cria algo novo em cima do antigo e reoxigena o estilo com um filme
revigorante, energizante e lindamente construído nos conflitos pessoais de seus
personagens. Não há nada pretensioso aqui, diga-se de passagem. Mas talvez seja
exatamente por isso que nos sentimos tão próximos dos protagonistas, tamanha a
humanidade de suas histórias compostas por muitas desilusões e sofrimentos até
o ápice.
Nesse contexto, entra em cena a magistral Emma Stone. Atriz corajosa,
que vem escolhendo personas cada vez mais complexas no cinema, Stone acolhe a
sua Mia como um presente, lhe dando uma clara oportunidade de levar a estatueta
dourada pela sua espetacular atuação. Mia é uma atriz iniciante, balconista de
um café, que tem o seu caminho cruzado por Sebastian, todos envoltos nesta
cidade extremamente competitiva, L.A., perseguindo fama e sucesso. É nesta
premissa que o roteiro pinta e borda, literalmente, tendo no elenco a chave
para o triunfo desta produção.
A evocativa fotografia, por sua vez, carrega uma
intensa paleta de cores que retrata a passionalidade com que os seus
personagens surgem em tela, sejam coadjuvantes ou meros figurantes. Tudo está planejado para emocionar – e o público adora ser enganado por
uma história bem contada - assim como a fábrica de emoções construída pelos
estúdios ou em takes a céu aberto. E a cena em que surge uma enorme tela fixa, pintada por uma bela paisagem
solar, para depois entrar em movimento com um letreiro escrito “Inverno”,
retrata bem o que o cinema é capaz de fazer com o seu público, refém de suas
artimanhas.
Não menos sensacional, a trilha sonora, a mixagem e a edição de som são um show à parte. Seja nas lindas canções que o
longa oferece ou até mesmo na “simples” captação de sapateados em cima de
carros - os sons diegéticos entram e saem sem cerimônia - o filme tem uma identidade marcante e a sua
alma é captada em qualquer movimento. A inspirada direção de Chazelle, que
emprega cortes rápidos quando necessários, e planos abertos sempre que
possível, é anacrônica em sua linguagem narrativa, somando, novamente, àquela
mensagem de reembalar o clássico e servi-lo com uma aquarela pop à nova
audiência, sem jamais soar superficial ou desrespeitoso.
Não à toa, o filme está concorrendo a 14 indicações ao Oscar, igualando o feito de “Titanic”; e se depender da minha torcida, levará quase todas as estatuetas pra casa.
*Avaliação: 5 pipocas + 5 rapaduras = nota 10