Estarei com Bilbo, Gandalf e sua comitiva até o final, "nas frias montanhas sombrias, até masmorras profundas e cavernas antigas".
Rafael Morais
18 de dezembro de 2012
*OBS 1: Esta resenha é livre de spoiler's;
*OBS 2: Infelizmente não tive a oportunidade de assistir ao filme em 48 fps (frames/quadros por segundo), portanto não poderei comentar sobre essa inovadora e revolucionária tecnologia cinematográfica, pois aqui em Fortaleza estamos há anos-luz da tecnologia e informação do eixo sul-sudeste. Mas pelo menos temos salas em IMAX. Ops, também não temos ainda. Só me restou então ver em 3D mesmo, com os óculos ridículos e desproporcionais do tipo new wave e com os aparelhos de ar-condicionado desligados para economizar a energia e não pesar no boldo do grupo UCI Ribeiro.
Esta resenha não se destina a comparar o livro com o filme, até porque não li a obra, mas mesmo que tivesse lido, este texto não se prestaria a auferir a fidelidade da adaptação. Como o nome sugere, adaptar significa aplicar convenientemente, ajustar, adequar. Assim, toda adaptação cinematográfica, baseada em uma obra literária, tem como característica imprescindível a liberdade criativa do diretor (e isso Peter Jackson tem de sobra) para se fazer certas escolhas - novos personagens, corte ou não de cenas, etc. - o que determina um plus ou bônus para os leitores que já sabem todas as passagens do livro. Então, não vejo problema em modificar algum trecho da obra original, uma vez que o resultado trará novidades e surpresas tanto para quem já conhece a história (os leitores de Tolkien) quanto para quem terá sua primeira experiência na Terra-Média.
A nova saga traz como tema principal a batalha da Companhia dos Anões, liderada por Thorin - Escudo de Carvalho (Richard Armitage), em busca de recuperar o seu lar, tomado pelo impiedoso Dragão Smaug (voz de Benedict Cumberbatch). Aliás, o prólogo apresenta a batalha por Erebor (terra dos anões), estabelecendo o conflito que permeará toda a aventura.
Vale salientar que a Companhia não é movida somente pelo resgate do ouro roubado pelo dragão, mas pela busca/retomada de um lar, da honra e dignidade de seu povo, bem como de suas origens e identidade. Mais um ponto positivo para o roteiro escrito a quatro mãos: Peter Jackson, Fran Walsh, Philippa Boyens e Guillermo del Toro. O quarteto pretende conquistar o espectador, inserindo e compartilhando o conflito dos anões, demonstrando que não estamos torcendo por uma reconquista meramente material/financeira. Repare, por exemplo, na gag representada pela cena em que dois dos anões enterram um baú cheio de ouro dizendo que é um investimento a longo prazo. Se fosse prioridade, com certeza levariam o baú, a todo custo, consigo nas batalhas.
Para iniciar a aventura, Gandalf (vivido pelo esplêndido Ian McKellen), convence Bilbo Bolseiro (o magnífico Martin Freeman) - um hobbit, astuto e de bom coração - a participar da longa jornada. A reunião dos anões e do mago na pequenina casa do hobbit é uma sequência agradabilíssima, conseguindo, ao mesmo tempo, ser um alívio cômico além de iconicamente inesquecível para os fãs da trilogia O Senhor dos Anéis. Como não rir diante do nervosismo de Bilbo ao ler um enorme contrato (leonino até não poder mais) e seus termos nada animadores, fazendo uma referência ao mundo burocrático que vivemos hoje. Como não se emocionar com o hino entoado pelos anões, e puxado por Thorin, antes de sair pelas batalhas mundo afora?
Tecnicamente impecável, o longa tem uma fotografia dualista (como não poderia deixar de ser), pois confronta o universo verde, colorido e próspero do Condado e de Valfenda, com o dark, monocromático e perigosos caminhos das cavernas dos goblins, espécie do submundo dos orcs. A propósito, o Condado tem a mesma aura alegre, rica em cores e detalhes vistas na primeira trilogia. Méritos da requintada direção de arte.
A épica trilha sonora, por sua vez, tem como tema principal o hino entoado pelos anões, em um instrumental orquestrado de arrepiar. A música aliada aos planos abertos, acertadamente escolhidos por Jackson, dá a dimensão do trajeto e percurso que a trupe vai percorrer, sem contar que ainda valoriza as locações escolhidas, tornando o filme em alguns momentos como um quadro em movimento.
Os efeitos visuais do filme são arrebatadores. Para quem estava com saudade de uma das figuras mais pop's do cinema de blockbuster, Gollum (vivido pelo talentosíssimo Andy Serkis), retoma sua coroa de melhor personagem 3D já criado, com um modelo ainda mais detalhado e capaz de mais nuances de expressão. Serkis eleva o nível de dramaturgia e atuação, merecendo que seja criado uma categoria no Oscar para atores que trabalham com captação de movimentos. Sem dúvida, o ator já teria levado várias estatuetas para casa. Mas duvido que os retrógrados da Academia inovem desta forma.
Na tentativa de esconder o principal vilão, apenas sugerindo o seu poder e tamanho, o dragão Smaug mal dá as caras, sendo certo que Jackson deixará o melhor para o fim ou meio da trilogia. Para sentirmos a seriedade da aventura, um sub-vilão é inserido na figura de Azog (Manu Bennett), um líder orc que flagelou anões nas histórias de rodapé da saga de Tolkien. O personagem é um contraponto à nobreza de Thorin Escudo-de-Carvalho, rei destronado que reclama seu legado na Montanha Solitária: a cidade de pedra e seus tesouros saqueados. Aqui há uma enorme semelhança com o roteiro de O Senhor dos Anéis (lembre-se dos conflitos existenciais de Aragorn), quando o argumento traz um hobbit como figura essencial à jornada, por ter um coração bom e ser, praticamente, despercebido. Sem contar que o próprio Thorin guarda consigo a chave do castelo com a mesma importância e magnitude em que Frodo detinha o "precioso".
Acontece que o fato de sabermos que Bilbo não morre durante essas aventuras, pois ele é o narrador-personagem e está vivo 60 anos depois, incrivelmente, não enfraquece o roteiro. Pelo contrário, mesmo tendo essa consciência, fiquei apreensivo na batalha final, dado o real perigo de morte que o personagem estava passando, me fazendo até esquecer de seu futuro.
Mas nem tudo são flores nessa nova produção. Radagast, o Castanho (Sylvester McCoy), um dos magos da ordem de Gandalf, é um tanto exagerado e caricato demais em todos os sentidos. Suas cenas, ainda que importantes (é ele quem descobre que o mal se instalou nas ruínas da cidade de Dol Guldur), sempre escalonam para o dispensável e o esticado - como na corrida de trenó de coelhos e na ressuscitação de um esquilo. Na verdade, várias cenas ali poderiam servir facilmente de extras nos lançamentos do DVD/Bluray. Mas essa esticada na duração do filme não me incomodou tanto devido à saudade que eu estava daquele universo. A meu ver, as quase três horas de duração passaram voando como as Águias Gigantes, responsáveis pela primorosa sequência final. Aqui, vale lembrar que embora a batalha entre os gigantes de pedra seja impressionante do ponto de vista visual, deixando os espectadores boquiabertos (lembra a icônica briga entre King Kong e os Tiranossauros Rex no filme dirigido pelo mesmo cineasta) não há como negar que a sequência não acrescenta em nada à narrativa da história.
Enfim, vejo que estamos, sim, diante de uma nova saga com propósitos e ideais grandiosos. Por mais que alguns críticos só enxerguem bobagens e deslizes, o universo recriado pelo grande cineasta Peter Jackson é merecedor de nossa admiração e respeito. Estarei com Bilbo, Gandalf e sua comitiva até o final, "nas frias montanhas sombrias, até masmorras profundas e cavernas antigas".
Putz que resenha excelente cara, o filme foi muito bom, esperava até menos dele, e sofri o mesmo problema dos ridiculos oculos 3D new wave e pra quem usa oculos de grau é terrivel e a sala tava com mudaças de temperatura, acho que a Uci queria economizr msm, era assim.. Tá quente, tá frio, tá quente, tá frio... Mas o filme valeu ter assitido mesmo nessas condições...
ResponderExcluirObrigado, Eduardo. Infelizmente temos que nos submeter a isso, pois temos poucas opções de cinema por aqui.
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