Por Rafael Morais
O despertar da cinefilia.
“Retratos Fantasmas”, de Kleber Mendonça Filho ("O Som ao Redor", "Aquarius" e "Bacurau"), propõe um olhar crítico, intimista e gradualmente universal sobre o desaparecimento das salas de cinema de rua. Partindo de Recife - terra natal do cineasta - especificamente do bairro Setúbal, o documentário/ensaio ganha vida ao desbravar, justamente, o quão efêmero podemos nos tornar ao subtrair a cultura da equação da vida.
Bairrista, saudosista, mas, acima de tudo, amante da sétima arte, o diretor narra com sobriedade, melancolia, e um quê de poesia, o resumo de anos de fitas, fotos e arquivos catalogados entre 1950 e 2000. Figuras que preenchiam aqueles espaços e locais públicos, ou não, são redescobertas aqui, quase como um processo de ressuscitação audiovisual. Aos poucos, o cinema foi sendo substituído por prédios comerciais, igrejas e farmácias. Sim, os remédios surgem inescusáveis para uma sociedade doente e que, mesmo sem saber, está sedenta por arte.
O poder do Cinema (e aqui com "C" maiúsculo) é complexo ao ponto de se observar os seus diversos aspectos: seja o lado mercantilista, ou pelo prisma do espaço de socialização, de conhecimento e lúdico – tudo ao mesmo tempo. A experiência catártica e coletiva, porque não dizer comunitária, de assistir a um filme em uma sala de cinema revela muito do que nós somos enquanto agentes transformadores
Concorrendo a uma das vagas de melhor filme internacional no Oscar de 2024 (foi o escolhido para representar o Brasil), “Retratos Fantasmas” chega ao catálogo da Netflix e se mostra uma excelente opção para quem valoriza a história e resgata memórias. O risco do descaso e esquecimento remete à finitude, à morte permanente. Afinal, quem não respeita o passado pouco se importa com o futuro.